24.8.13

ana c. no longa bruta aventura em versos


capa - Jefferson John


artigo de conclusão da especialização publicado!

foi um processo agitado... em que aprendi demais, demais.

só tenho a agradecer ao Bruta Aventura em Versos, por me apresentar a Ana Cristina Cesar e a Letícia Simões, mulheres incríveis e inspiradoras. a Letícia junto da minha orientadora, Cláudia Fazzolari, com suas vozes suaves, comprometidas e consistentes foram fundamentais nesse caminho cheio de descobertas e mergulhos.

nessa trajetória só ficou mais evidente a importância das pessoas que sempre estiveram ao meu lado, minha família e amigos. e de como entrar em aventuras e confusões pode significar ser uma boa mãe, nunca tive tanta certeza de que estamos no caminho certo, do que quando vi no meu filho o maior incentivo e apoio para não desistir... ele é um menino praticamente pós-graduado!

e o meu orgulho segue em dobro, pelo meu trabalho e por todas essas pessoas lindas que me cercam. obrigada!!

pra quem quiser ler está aqui, o artigo:
http://myrtus.uspnet.usp.br/celacc/sites/default/files/media/tcc/613-1868-1-PB.pdfhttp://myrtus.uspnet.usp.br/celacc/sites/default/files/media/tcc/613-1868-1-PB.pdf




estômago


desenho de Juli Ribeiro


nenhuma palavra pode dizer o que sinto, quero voltar para o desenho, usar cores, fios e corpos pra representar esse emaranhado aqui no estômago.

mais ainda quando uma lembrança atropela, não quero mais memória, nem conexão, só quero rede de proteção, uma mão no rosto e um peso sobre o corpo. qualquer um que não seja feito de dúvida e discurso.

todo dia ela faz tudo sempre igual e eu choro só de pensar que não vamos nos encontrar.

não vamos porque desisti, não sinto vontade, nem entusiasmo.

o emaranhado se confunde com falta de coisa concreta. boca, água, manha, olhos fechados, peito, nuca, pele e aflição.

não sei mais que aflição é essa. não me venha falar de práticas orientais, quero saber do que posso pegar com as mãos e colocar na boca, sentir gosto, cheiro, amor e raiva. desvarios. de desvarios se fazem noites pra afogar lágrimas, quero afogá-las todas e sem culpa alguma cometer excessos.

por uma noite, ou duas...


17.8.13

não me encaixo


Ana Mendieta - performance - 1972


tive um pesadelo: não existo pra você
e sempre foi assim

por um período
fui um reflexo mais nítido de espelho

uma voz confortável
uma mão suave
pra acariciar seus cabelos
um corpo
moldado por suas vontades

não existo pra você
acho
não
sei

você nunca tem a dimensão real do que acontece
se convenceu de suas regras
de sua ética bem fundamentada
verborrágica
perturbadora

não aguento mais uma palavra sua
suas certezas e pessimismos me irritam
profundamente
não te suporto

a personalidade que rabisquei
cheia de cores
de vida
não faz mais sentido nessa relação
fajuta

não quero mais contar mentiras
não quero desperdiçar meus sonhos surrealistas
não quero mais te desenhar
te enxergar
nem te usar

o seu olhar macera

na minha fraqueza
insisto
numa vingança ridícula
você não existe mais

da sua forma
nas suas formas
não me encaixo mais



13.8.13

de todos os dias




costurar é dar um ponto e mais outro
mais e mais
um ponto
é um exercício de paciência
pronto
demora
se o tecido é grosso
as pontas dos dedos doem
quando pego numa agulha lembro da minha avó
das unhas bem feitas e rosas
da pele lisa e manchadinha
do sabor do arroz doce

fazer comida é lavar os legumes
cortar a cebola
dosar o sal
os ruídos da cozinha esquentam
dão fome
quem cozinha pode ir experimentando tudo
a comida está pronta
quando a barriga do cozinheiro está cheia
de comida crua
e molho sem sal
o melhor da cozinha é o vapor que levanta das panelas
mais ainda quando está frio

cuidar do filho é dar bronca
e depois não resistir a cara linda
sair dando cócegas e tentando levantar do chão
como se ainda fosse pequeno
como se fosse um brinquedo
desses de morder a bochecha e o nariz

ser mãe é colocar pra dormir
e não resistir
a mais um "boa noite"

aproveitar a noite
é colocar uma música
e brincar de backing vocal

fazer passinhos
dançar valsa
e guerra de almofadas



2.8.13

rabiscada




me sinto forte falando com toda energia, as palavras ecoam tentando me lembrar. lembre do que você mesma repetiu com tanta certeza. lembre sempre do mais importante, que o mundo não gira ao seu redor e é preciso encontrar alguma consistência, não se desmanchar. pra não sentir tudo latejante, as vezes todas as vozes em volta soam mais altas e opressoras, o sono é ruim e fragmentado, deixando o corpo e a alma frágeis. a voz que era doce se revela pouca e só. só num sonho perdido que não faz mais sentido, em que o tempo para respirar é acelerado e a capacidade de resolver coisas vacila.

a sensação de ser rabiscada e cortada não é nada boa.




minha energia foi embora junto com a vontade de devorar a vida, os lugares e as pessoas, tudo parece demais e me vejo como a peça imprecisa que tanto critiquei. todos tomaram seus lugares. aos poucos fincam suas raízes, penso se algum dia ainda encontro o meu. estou distante demais de tudo e quase perco o fio que ainda me prende em algum sentido, não posso voar alto, não tanto, não agora.




não estou tentando resolver nada, não mesmo. estou suspensa e só. quantos caminhos existem. quantos pude experimentar, saber o que não se quer não alivia o vazio que fica. algumas pessoas foram feitas para o deslocamento persistente, mesmo com as mãos estendidas, se afastam cada vez mais. juro que não sei porque. mas acontece assim, se repete assim.

de repente o que restava vai ficando mais distante, gelado e oco. as palavras não estão servindo. nada é claro. todos os pedaços vem e voltam confusos e nada mais serve nesse molde feito e refeito, depois de tantas dúvidas.

eu sinto a vibração e os ruídos em volta, não alcanço. peço uma música triste. queria ter uma garrafa de vinho, nada de vinho bom, amargo ou caro. um suco doce pra acompanhar a melodia e as notas, pra apertar o botão certo e destrancar a sensação de angústia. já prometi que não bebo mais, promessas são tão ridículas quanto cartas de amor.




e quando você se depara com a suposta liberdade não encontra vontade pra nada, nem reencontro, nem surpresa, nem carinho, nem sermão. tudo isso porque sou mimada pelos espíritos dos sonhos, com suas cores voluptuosas, com suas máscaras intrigantes e cheias de imaginação, sou mimada demais pelo céu suave e azul, azul, azul, soslaio, de nuvens encantadoras tocando sua própria melodia hipnotizante, me guiando inconsequente a querer só o que valha como a respiração mais profunda do aspirante ao conhecimento.

e tudo o que é concreto demais exaure, tudo o que é sonho demais está longe.


as tirinhas são do Liniers, amor a primeira vista apresentado pela linda Fernanda Ninomiya.