leonilson - 1988 |
um passo e outro, pedra, guia, asfalto
queimando sola, carne e osso
suor no pescoço
amanhece, anoitece
o tempo bate frio no rosto
de fora a fora
reunião, conversa, palavra trocada, televisionada
não ouvimos, não obedecemos
os discursos não fazem sentido
as vozes baixas e o olhar atravessado cortam
nas casas, nos morros e vielas
cada um se apega às suas esperanças
choram suas crenças
a conta termina cada dia mais apertada
na dispensa, uma lata salva a sopa na noite fria
ônibus passam carregados
os rostos são negros, são pardos
só na novela os quartos tem janelas ensolaradas
cabelos, sorrisos e pele de propaganda de margarina, de cerveja e shampoo
os pobres são peça de boutique, na última moda
a vida real nos acorda
invade nossos sonhos nas poucas horas de sono
na água gelada na cara
na notícia da primeira hora: país em recessão
na hora de pagar a conta
nas lágrimas de cansaço
na cabeça do peão
no choro das mães de maio
que correm por seus filhos e filhas
um passo e outro, pedra, guia, meio-fio, asfalto
queimando sola, carne e osso
o tempo bate frio no rosto
de fora a fora
suor no pescoço
amanhece, anoitece