27.1.17

lateja


Vento, ilustrações livres II, Juli Ribeiro - https://www.instagram.com/juliribeiroc/


I.
tem o corpo, a carne e o sangue
tem o gesto e a palavra.
acorda e levanta,
sente a asa do quadril
tensionando a carne.
fecha os olhos,
formigamento até os pés,
veia expandida.
cada sangue e músculo por baixo da pele
lateja,
contorce um tanto as entranhas,
solta e prende.
conta-gotas estala na água,
olha por entre as pernas,
cerâmica de aquarela.
espera um pouco...
deixa ficar vermelho 
puxando por um fio de muco,
sua frio,
um suspiro
e o sangue volta a face.
II.
puxa a calcinha de lado,
as mãos nas coxas
pressionam o corpo gelado.
respira um pouco mais fundo,
perto do pescoço até a ponta da orelha,
encosta cada parte até aderir
toda as costas.
com a boca cheia de água
o lábio corre molhado na pele,
encontra os cabelos na nuca,
mordida no ombro.
a asa do quadril cede,
o espasmo se perde, 
confunde,
no ajuste do corpo pra sentir prazer...

Original publicado no Esquerda Diário: http://www.esquerdadiario.com.br/lateja

faço da poeira meu camarada


aniversário do Brandão e da Dini

a poeira de terra vermelha 
encontra a umidade 
de um dia pro outro
pastosa lama pedregulhenta 
corta a madeira 
cavoca o buraco
metal arranhando o mato
um latido 
uma galopada 
bate as mãos no jeans da calça 
garoa fina, fina 
tenta nos molhar com o vento de lado 
as conversas borbulham e se misturam 
nos sonhos dos jovens de pouca e de mais idade...
a fogueira segura a cantoria 
engrossa a palma nas cascas e galhos 
queima as solas dos sapatos 
enrubece as bochechas 
evapora o hálito de cachaça 
a fumaça arde e faz brilhar os olhos


tem noite que esconde lua, estrela, nuvem
 
tem gente que carrega tudo isso no peito

mensagens sonâmbulas

ilustração da Juli https://www.facebook.com/juliribeirochttps://www.facebook.com/juliribeiroc
os impulsos vão nos carregando

quanto depende da nossa vontade?
altos e baixos
pra tão perto e tão longe...
a vida vai correndo, cheia e vazia.

bebi, ri, chorei, dancei de madrugada
cometi todos os erros
tive insônia
dividi minhas alegrias e tristezas com quem tava lá
fiquei sozinha
dormi
mandei mensagens erradas
sonâmbulas

dei todas as risadas
chorei as lágrimas que tavam presas

não fiz absolutamente nada
fiquei por algum tempo paralisada
mas a vida nunca deixa
eu não deixo
parar por tempo demais

não sei o que to fazendo
tem um plano bem arranjado em algum lugar
de um jeito meio atrapalhado
às vezes faz mais sentido, às vezes menos

e tem a vida
que vai acontecendo com esse corpo
com essa alma, cabeça e coração
cada um com vontade própria
com seus próprios mecanismos de defesa
de loucura
de vontade

que correm e correm
e de repente, param tudo de novo.



Original publicado no Esquerda Diário: http://www.esquerdadiario.com.br/mensagens-sonambulas