26.1.18

impressões sobre a greve

texto que escrevi pro movimento Nossa Classe durante a greve na USP de 2014, momento importante pra mim, que me despertou e ganhou pra vida política.

tinha um monte de angústia muito forte, que de certa forma me sufocavam e acabavam me deixando doente sem enxergar um sentido pra tudo que acontecia. me dá uma coisa agora no peito, sendo quem sou hoje, encontrar por essas palavras a pessoa que era naquele momento. tem uma ingenuidade e uma força nessas impressões, me orgulho bastante delas.

de 6 de julho de 2014

Quando participamos de uma mobilização a compreensão sobre ela muda, mais ainda se nos sentimos parte de cada decisão e ação tomada. Essa tem sido a impressão entre todos os trabalhadores que tenho conversado durante as atividades e assembleias de greve. Muitas pessoas que antes tinham receio de participar, agora valorizam a importância desse momento de profundas transformações. Todos querem sim voltar aos seus postos e retomar seu trabalho, mas não sem antes serem ouvidos, pois o que faz dessa greve tão grande e forte, é a legitimidade de todas as reivindicações.

ato da USP até a Paulista, Caio tava junto

Acabo lembrando de alguns projetos que participei nos meus anos de trabalho na Prefeitura, tentativas de repensar, de modo participativo, o uso do espaço público do campus, priorizando as relações humanas, o ensino, a pesquisa e a extensão universitária. Mesmo com alguns avanços, me frustrei bastante em constatar como a USP é resistente a mudanças, não se beneficiando do conhecimento que ela mesma cria. Ouvi professores, funcionários, estudantes e agentes da sociedade com vontade de fazer parte da construção de uma universidade pública melhor, mais justa e aberta para todos, sendo esmagados por uma estrutura de poder engessada e egoísta.

No cotidiano, as dificuldades são tantas, que não existe uma pessoa que já não tenha se sentido desrespeitada. Como funcionário, professor ou estudante pelo autoritarismo hierárquico, ou como cidadão, por acompanhar de perto como o dinheiro público é gasto desgovernadamente pelas vaidades momentâneas no poder. As contas não batem e os discursos dos dirigentes não convencem.

reunião da Secretaria de Mulheres durante a greve

Conseguir parar e refletir como outra lógica de funcionamento pode existir, tem sido um dos grandes ganhos dessa greve. Uma lógica que questiona a serviço de quem estamos trabalhando, o que significam os cortes de verba, a falta de reajuste e as terceirizações, a precariedade do nosso trabalho serve a quem afinal?

É por isso, que pelos trabalhadores da saúde, com péssimas condições de trabalho e de atendimento digno à população, estamos em greve. Por todos os trabalhadores das áreas operacionais da Prefeitura e de outras Unidades, com condições de trabalho sucateadas em favorecimento das terceirizações, estamos em greve. Por todas as cozinheiras e colegas de trabalho da Superintendência de Assistência Social, que sofrem com doenças causadas pelo esforço repetitivo, sem condições para exercer suas atividades de maneira saudável, estamos em greve. Por cada trabalhador do setor acadêmico, técnico, financeiro ou administrativo, que não conseguiu impedir uma decisão arbitrária ou mal planejada, estamos em greve. Pela transparência nas contas e na gestão, estamos em greve. Pelo reajuste salarial, contra demissões e processos políticos, pelo aumento da porcentagem do ICMS e justo repasse das verbas para a educação, estamos em greve. Pela abertura das negociações e liberdade de Fábio Hideki, ativista em diversas causas, funcionário da USP, preso político, estamos em greve.

com Brandão e Amanda na festa de comemoração no final da greve

E assim, aprendemos participando, que estar em greve é estar em movimento, é estar presente todos os dias, conhecendo as histórias de luta de cada trabalhador. Entendemos que fazer greve dá o maior trabalho, pois é um processo de aprendizado contínuo e de ressignificação do nosso papel. É o impulso para que cada indivíduo se aproprie da sua força de trabalho, enxergando seu verdadeiro valor e, mais que tudo, se enxergando como um coletivo capaz de propor mudanças e de ser ouvido.

de Yuna Ribeiro
funcionária da Prefeitura do Campus da Capital/USP