7.12.15

fui pega




fui pega por uma tempestade

de ventos e humores
úmida e fria
ventania
chuva
vida

fui pega
girando, girando

por uma tempestade
por algum ar
liberdade
sonhando, sonhando

por uma tempestade
que me leve daqui
que liberte a todos nós
que escoe o suor
a sujeira do rosto
o sangue

subindo, subindo
pelas pontas dos dedos
dos pés aos cabelos
do alto mais baixo dos sonhos
pra tocar alguma coisa

tocar, tocar

o chão
o céu
o vento
de outro lugar
fora de mim


25.11.15

palavras doces

insistiu em abrir todas as portas e janelas, recorreu a lua, sol e seu céu do azul com nuvens favorito. andou por tantas calçadas com os pensamentos soltos, sem sentido, que a faziam viajar para longe, para um lugar bem escondido, dentro de si. 

estava difícil enxergar o sentido, lembrou da última vez que não se sentiu assim, lembrou do que a prendia aqui, das pessoas em volta, das pessoas que se foram, de tantas palavras e sentidos que já a atravessaram, bons e ruins.

na vontade de se sentir firme, procurou sua raiz, na desilusão de se sentir parte, se deparou com todos os deslocamentos, ausências e silêncios.

desistiu.

na insistência que a vida impõe, seguiu.

num passo e outro, indo ao trabalho, voltando pra casa, andando por ruas vazias e cheias, a noite caindo, as luzes do trânsito tomando conta da avenida principal.

ao receber palavras doces, sentiu saudades, quis se afastar da frieza, do silêncio e da distância. num sentimento de impotência e medo, vacilou na vontade de sonhar.




23.10.15

você, o sol e o nosso beijo




II.

tem alguma coisa entre você, o sol e o nosso beijo
quando acontece esse encontro
a sensação quente nos lábios
vai até o coração
num dia desses
de saída ensolarada
de horário de verão
os raios do sol atravessavam nosso beijo
que se demorou
se misturando com um sorriso
de alegria
de saudade
de pele
e calor, amor...


I.

não deixo de me impressionar com o sol
a cada manhã
a cada intervalo de almoço sentada na praça
as mangas arregaçadas
sentindo a luz alaranjada
por trás das pálpebras

olho pra você
não te enxergo inteiro
os raios de sol vão revelando aos poucos
os cílios
o canto do sorriso
a barba

vou me demorando em algumas partes
misturando com a voz
e a sensação do sol de inverno suave nas costas
deixo a pressa de lado pra ficar mais um instante

o sol, a textura da sua camisa, você
me abraçam de um jeito
fica difícil ir embora

num beijo breve de despedida
fica um quentinho no peito
e uma tarde passa ligeira

20.9.15

pra alimentar ou matar, tudo isso, por dentro

escrevo aqui pra dizer algo que precisa sair, não sei bem pra onde ou como, é algo que sufoca por dentro, um pouco a cada dia, e mais forte em alguns momentos, algo que repuxa e se contorce do estômago até a garganta, que vem nas noites na forma de sonho, nos dias na forma de angústia, algo que me prende em apatia e choro, algo que me sufoca e empurra ao mesmo tempo.

não posso explicar sem ser confusa, é uma guerra todo dia aqui dentro, uma guerra pra levantar e sair de casa todos os dias, fazer tantas e tantas coisas, coisas que alimentam um sistema que só nos mata aos poucos, bater o ponto, correr atrás do ônibus, ver o dia no intervalo do almoço, formar palavras, pilhas de papéis e processos sem sentido...

e tem dia que é mais cinza e as emoções tomam proporções maiores porque se refletem em todo o céu úmido e frio.

e mesmo nos dias abafados e quentes, a falta de ar pesa na respiração, nos pés inchados presos nos sapatos, nas grades das janelas, nas caixas de cimento em que nos enfiamos...

em outras caixas por aí, o peso sobre os corpos é muito maior, a ameaça faz parte de cada minuto do dia, o dinheiro no final do mês não dá pro aluguel, pagar as contas e pra comida, o peso nas mãos provoca doenças em muito pouco tempo, o peso das ideias mata o que resiste de humano, o que sobrevive de orgulho. e todas as mentiras, tantas mentiras, escondem a história das pessoas, das morais e dos lucros. enganos forjados, carnes marcadas e muita, muita propaganda pra fazer ruído e falar mais alto que toda indignação.

somos cobrados a todo momento, e nossas incapacidades são usadas pra nos humilhar, não temos saúde, não temos escola, não temos direito sobre nossos corpos, mas não podemos sofrer, temos que estar sempre fortes e prontos pra cumprir nossas funções, quem não sabe a letra não tem voz, não tem escolha, tem que sorrir e obedecer, mascarando o desespero de viver doente e revoltado nesse mundo que só pode provocar doença e infelicidade.

perco o fio do que quer sair, tudo é distração pra diluir a finalidade das coisas, tarefas e mais tarefas, organizacionais, culturais, materiais, sindicais, militantes, amorosas... todas, todas se confundem com o enorme emaranhado em que estamos imersos, cedo ou tarde entram na dinâmica maluca de confronto, estamos todos nos confrontando a todo momento, não confiamos em nós mesmos, menos ainda em nossos companheiros, travamos uma grande e enorme briga porque nosso maior instinto é nos defender, sobreviver, nossas palavras e ações são carregadas de todas as nossas pequenas defesas construídas ao longo de uma vida inteira, são carregadas dos enormes muros que levantamos a nossa volta, que nos deixam tão, mas tão bem cercados, que não podemos enxergar o que há em volta, são pedras e mais pedras, enfileiradas sobre concreto, o ar que fica a nossa volta vai ficando gelado e rarefeito...

e pulamos, e nos debatemos com toda a força querendo sair, puxamos alguns pra dentro do nosso cercado de proteção, impomos nossas regras, falamos um sem fim de motivos apenas pra explicar quem somos e porque estamos legitimamente nos defendendo, e todos estão tão corretos que todas as explicações são facadas na direção dos outros... e nossos corpos estão cansados demais.

e essa batalha a nossa volta só aumenta a carne viva que é a batalha por dentro desses corpos, corpos novos, velhos, rígidos, flácidos, negros, brancos, com seus gêneros, seios e sexos, com suas marcas de nascença, marcas de machucado, com suas mutilações, seus pelos, pintas e espinhas, cabelos curtos, longos, crespos, lisos, encaracolados, e suas formas e suas extensões, desenhos, brincos e artefatos, pra enaltecer, provocar, desmontar padrões, lógicas e expectativas.

e no fim tudo é uma grande escolha, uma grande e definitiva escolha de quem somos, do que queremos ser e construir, de quem queremos ao nosso lado, que discursos são nossos, são próximos, do que aceitamos, e do que nos mata mais um tanto todos os dias, por nos impor o que não queremos, o que não escolhemos e mesmo assim está sobre nossas cabeças como uma enxada pronta a fincar a terra.

que maldição é essa de viver, sem poder viver, sem poder sentir o que sentimos sem esses montes de muros e labirintos a nossa volta e dentro de nós, saímos das discussões mais concretas pra nos perder mais e mais nas batalhas psicológicas, de provar quem somos, que estamos certos.

pra ficar ou sair, enfrentar ou fugir, de um lado ou de outro, sentindo tanto e tanto, tanto a ponto de entregar nossas vidas a essa máquina de moer gente, de fazer dinheiro, lucro, concreto, metal e juros, que movimenta toda a fortuna do mundo, enquanto morre gente, morre gente todo dia, na calçada da periferia, no mar de refugiados, pelas armas das instituições, do sistema e suas fronteiras.

pra alimentar ou matar, tudo isso, por dentro.



8.9.15

sensorial em 6 tempos




i.

me entrego aos sons
(com você) consigo fechar os olhos
o tempo para
e corre
a pele encosta leve no lençol
no ombro
no corpo
que se entrelaça
deslizando
acomodando
todos os encaixes de um quebra-cabeça
que por um momento preenche todo espaço
dentro quente
fora ampliado

ii.

o som chega logo a um ponto bem específico dos pensamentos
ligado direto ao pulsar no peito
estômago
e pontas dos dedos

iii.

a sensação ofusca a vista
num entorpecer que passa pelo fundo dos olhos
fechando devagar as pálpebras
pra enxergar as ondas de energia
numa meditação profunda
no mergulho mais fundo
(nas águas)
que nos engolem
depois de tantos erros e acertos
ainda temos coragem de arriscar
de pular

iv.

porque tudo fica simples
por um breve momento
e é só um momento
pra encontrar
viver
desvendar saudades
sentir
e querer ficar mais um pouco

v.

parece muito
tanto
que transborda...
são tantas as coisas que podem nos levar a isso
notas, palavras, imagens, toques, desejo, cuidado, carinho, sentidos
e com você
todas acontecem ao mesmo tempo
não existe a menor chance
de não sentir

vi.

amparo
troca
conversa
e beijo

5.8.15

de você





é fácil, fácil
deixar o medo pra lá
suas mãos passam nas minhas costas
e já esqueci

cada peça de roupa é demais
é obstáculo deixado
amarrotado no sofá
pra me encostar
sentir a pele e aproximar

é difícil, difícil
segurar cada gesto
que toma conta por si
da saliva, das mãos
da minha vontade

de você



* nem sei se podia, essa música tomou conta das minhas noites e não resisti


21.7.15

vontade não obedece




vontade não obedece, segue e leva
dando a volta tão certeira
pra te encontrar

a mão logo
querendo tocar
o rosto, a nuca

palavra roda
vontade encosta
desencontro acorda
sonho com gosto de noite fresca

boca feita de vontade
de sede, de água
de gentileza

gosto da textura na ponta dos dedos
na borda dos lábios

sensação de esquecer
tudo mais em volta
e mergulhar na pele

pra perder
pudores, medos
rir dos tropeços

caindo mais um pouco
na conversa suave, discreta
da voz, da pele e dos pelos

de desacordar tantas vezes
sentindo
e perdendo também os sentidos
soltos todos
por aí


22.6.15

pra não esquecer - ouvindo as histórias da tia-avó

tem momento que a gente não quer que acabe, ouvindo as histórias da tia-avó faz o tempo passar como brisa. sem deixar a intensidade, Wen Hui vem de muito longe na memória e no espaço para nos trazer as histórias de sua tia-avó e da China, numa costura de olhares, de mulheres e de vidas, como quando nos sentamos em família pra puxar na lembrança de onde viemos, como chegamos até aqui, nossa genealogia, dos lugares que passamos ou que fazem parte do que somos por ligações sutis.

pra além das palavras, fica a beleza da cultura e arquitetura rústica dos vilarejos chineses, em composição com as linhas dos tecidos, dos cabelos, dos corpos, ora rijos, ora suaves, numa dança pausada, que quase resiste a liquidez dos tempos.

na história política das pessoas e coisas uma série de elementos intriga, ficando a vontade de conhecer melhor o contexto e o mundo que abrigaram e provocaram dores, alegrias e profundas transformações.

Programa:

"Listening to the third grandmother's stories" (Crédito: Divulgação)

Na infância, a coreógrafa e bailarina chinesa Wen Hui, 55, dançava em desfiles para Mao Tsé-Tung (1893-1976), o "grande timoneiro" da República Popular da China.

Na adolescência, treinava sob a disciplina rígida da escola de balé estatal. Adulta, ela aprendeu técnicas de mestres da dança moderna.

"A história e a sociedade marcaram e moldaram meu corpo", diz Wen. É essa memória corporal-política que ela apresenta na ocupação de seu coletivo The Living Dance Studio no Sesc Pompeia.

O grupo independente chinês monta no Brasil o seu projeto "Memória-Futuro", em que sobrepõem coreografias, performances, vídeos e artes gráficas para contar a história recente de seu país.

A Revolução Cultural iniciada por Mao na década de 1960 e a Grande Fome vivida na China nos anos 50 são os temas da ocupação.

O projeto, coordenado por Wen e pelo cineasta Wu Wenguang, cofundador do Living Dance, começou com a busca dos depoimentos de chineses que viveram essa história em vilarejos distantes ou próximos de Pequim.

"Fazemos um trabalho político. Os chineses não gostam de se lembrar dos problemas do passado", diz Wen.

A "vida real" se espalha pela ocupação no galpão do Sesc Pompeia por meio dos depoimentos filmados, dos cartazes de propaganda maoísta, das fotos dos entrevistados e é reelaborada pelas performances de dança.

"Ouvindo as Histórias da Tia-Avó", é baseada nos depoimentos dados à Wen pela última sobrevivente da família de seu pai. Wen contracena com sua mãe, de 79 anos.

Em fevereiro de 2011, a coreógrafa Wen Hui retornou ao vilarejo em que seu pai nasceu para buscar as memórias perdidas de sua família. Localizado na província Yunnan, o vilarejo chamava-se Yi Men, e seu pai não o visitava há 50 anos. Durante a viagem, Hui se deparou com uma velha senhora, a última sobrevivente da família de seu pai: sua tia-avó. Su Mei Lin, 83 anos, natural do condado de Shuang Bai e agora moradora do vilarejo Da He Bian. Por três semanas a coreógrafa viveu com sua terceira avó, ao longo das quais a ajudou em sua fazenda e ouviu suas histórias sobre o passado. Isso a instigou na construção dessa performance/documentário.

“Enquanto procurava por memórias esquecidas de minha família, descobri minha tia-avó. Ela é a única pessoa de sua geração ainda viva dentre meus parentes. Ela é tia de meu pai, mas nem ele nem minha família a haviam mencionado antes. No último inverno eu a encontrei num vilarejo nas montanhas de Yunnan. Seu nome é Su Meiling e ela tem 83 anos; quando a conheci foi como se ela estivesse esperando a vida inteira pela minha chegada — esperando por 83 anos. Permanecemos juntas e ela me contou sobre sua vida. Por meio de suas histórias, eu conseguia ver como as grandes mudanças da China haviam afetado a vida de uma mulher.” (Wen Hui/direção)

Wen Hui (Crédito: Guia Folha)

fontes: http://app.folha.uol.com.br/site/noticia/562660
http://www.obeijo.com.br/eventos/the-living-dance-studio-china-12769556

15.6.15

dia a dia

{da semana passada}

piscamos e o dia a dia passa
se passam manhãs e finais de tarde
poucas palavras trocadas, nenhuma verdade
tentativas vazias
e já desisti tantas vezes
mas sempre tem uma manhã mais gelada
em que a frieza das relações dói mais

esse mundo cheio de pessoas tão vivas está morto
e está nos matando
aos poucos esquecemos dos pontos que tínhamos em comum
das risadas que nos salvaram tantas vezes
do olhar vivo e carinhoso
dos desencontros cheios de vontade de existir

de pertencer
de ser

na falta de perspectiva de mudança
o instinto me empurra
ora pra palavras desajeitadas
ora pra uma vontade feroz de fugir
sumir

estar em qualquer lugar
em todos os outros
porque machuca demais
ficar aqui



*desnecessário

[quase toda poesia esbarra no amor, essa é sobre o amor que coube nas pequenas brechas das relações fraternais, que esperávamos salvar da frieza.
é sobre a perda das nossas relações irresolutas...
e tentar ter paciência pra acreditar, que os motivos não poderão ser negados, as causas vão falar mais alto, e mais uma vez vamos nos deparar com escolhas.]


1.6.15

amar o amor





a gente começa e termina
muda as regras
solta os laços
da a volta
vive de ponta cabeça

perde um tempo danado com o amor perfeito
esquece da vida...
experimentando outras formas de amor
livre, aberto, ligeiro, rasteiro

pra ficar a saudade
aquela do amor...

de amar o amor¹



_____________

¹ tá, tá meloso, desculpa aí!


27.5.15

de fora a fora

 
leonilson - 1988

um passo e outro, pedra, guia, asfalto
queimando sola, carne e osso
suor no pescoço
amanhece, anoitece
o tempo bate frio no rosto
de fora a fora
reunião, conversa, palavra trocada, televisionada
não ouvimos, não obedecemos
os discursos não fazem sentido
as vozes baixas e o olhar atravessado cortam

nas casas, nos morros e vielas
cada um se apega às suas esperanças
choram suas crenças
a conta termina cada dia mais apertada
na dispensa, uma lata salva a sopa na noite fria
ônibus passam carregados
os rostos são negros, são pardos
só na novela os quartos tem janelas ensolaradas
cabelos, sorrisos e pele de propaganda de margarina, de cerveja e shampoo
os pobres são peça de boutique, na última moda

a vida real nos acorda
invade nossos sonhos nas poucas horas de sono
na água gelada na cara
na notícia da primeira hora: país em recessão
na hora de pagar a conta
nas lágrimas de cansaço
na cabeça do peão
no choro das mães de maio
que correm por seus filhos e filhas

um passo e outro, pedra, guia, meio-fio, asfalto
queimando sola, carne e osso

o tempo bate frio no rosto
de fora a fora

suor no pescoço
amanhece, anoitece




8.4.15

a dor e a vontade são maiores


Pais do menino Eduardo de Jesus, de 10 anos, que morreu no Complexo do Alemão após ser baleado 
Foto: FÁBIO GONÇALVES / AGÊNCIA O DIA/ESTADÃO CONTEÚDO

Complexo do Alemão. Foto: RICARDO MORAES

quero sentir as dores e as vontades desse mundo, meus gestos não alcançam.
sinto as lágrimas retesadas na garganta, que querem chorar as dores das mães, mulheres e filhos... não são suficientes.
sinto a raiva mais dura e bruta, dessa força que ainda não alcança, não muda, não transforma.
sinto a voz trêmula, o impulso, não sei o que dizer.
ânsia e angustia desconexas se perdem nesse mar de interesses, no medo, no sangue escuro, queimado, pisado, no asfalto rachado, na pele esfolada da carne mais barata do mercado.

mãos ao alto!
na favela, filho da mãe é lágrima, choro, grito, é esperança que morre a sangue frio, é suor, é urgência, é revolução.

a repressão quer ser do tamanho do sonho, a dor e a vontade são maiores.

23.3.15

Paulão, sempre presente!













Nota em homenagem ao nosso companheiro Paulão

Paulo Roberto Gonçalo Samuel, mais conhecido como companheiro Paulão, estava com 58 anos, começou a trabalhar na Prefeitura do Campus em novembro de 1987, sempre como motorista na área de Transportes dividiu suas atividades principalmente entre o Circular e serviços para a área de compras. Para nós, trabalhadores da Prefeitura, era sempre uma feliz surpresa quando íamos fazer algum serviço de carro ou ônibus, e encontrávamos o Paulão no volante, com ele sentíamos a segurança de uma viagem tranquila, cheia de muitas histórias, boa conversa e uma chance de aprender muito sobre a vida. 

Como Paulão nunca se interessou por disputas de cargo e posições com seus colegas de trabalho, dirigiu o ônibus Circular até seus últimos dias de funcionamento. Foi uma liderança reconhecida e fez parte de muitas mesas de negociação para defender os direitos dos motoristas e trabalhadores, sem medo e com orgulho de ser trabalhador nunca abaixou a cabeça, como ele mesmo dizia, não sabia "prefeitar" e não ostentava uma formação acadêmica, mas sabia dirigir como ninguém e o Circular só saía da garagem quando os trabalhadores eram ouvidos e respeitados.

Nas lutas travadas na USP, Paulão era conhecido por todos, presença firme nos piquetes todos os dias, por mais longas que fossem as greves, esteve do lado dos trabalhadores até o final. Na última greve, que durou 118 dias, participou como membro do Comando de Greve, como exemplo de apoio em todas as lutas e como uma referência, tanto para os trabalhadores de mais anos de casa, como para os novos, que enfrentaram sua primeira greve e tinham nele um bastião de força, com palavras de firmeza e tranquilidade, com muita força para os momentos difíceis, mas também com bom humor e a risada que era só dele, para não deixar ninguém desanimar.

Cada um aqui na Prefeitura e na USP, que tenha passado pelo caminho desse querido companheiro, certamente tem alguma história muito boa para contar. Paulão estará sempre presente como um exemplo de força, orgulho e amizade, ele faz parte da nossa história e da história dessa Universidade. Temos a certeza de que ele fez de tudo para que esse seja um espaço mais justo e um espaço para todos, que atenda as verdadeiras necessidades dos trabalhadores e da população mais pobre. Em sua trajetória defendeu o direito ao emprego, o direito de greve e mobilização, a saúde e educação pública e de qualidade para todos. Paulão não só acreditou que cada um tem um papel determinante na construção dessa sociedade mais justa, ele ousou e viveu como acreditava, sendo uma verdadeira centelha de transformação. Cabe a nós, levar em nossas mentes e corações esse exemplo adiante. COMPANHEIRO PAULÃO, PRESENTE!!!

14.3.15

tempo suspenso




toda essa vontade de mudar é um impulso desesperado, agoniado, apressado de fazer o tempo passar, de sair desse tempo suspenso...

tudo parou no último mês e sem saber o que fazer me entreguei pra essa suspensão temporária, arbitrária...

ao mesmo tempo que tudo continua acontecendo, passando e passando por mim.

as coisas estão perdendo o sentido, está tudo triste demais.

nessa suspensão que não me dá descanso, que não acalma e nem resolve nada, todo esse tempo parado acumulando no peito, nos sonhos, nas lágrimas.

que quer logo e mais, transbordar...

pra que eu possa chegar, chamar, ouvir, sair desse lodo, de mim...


19.2.15

o vento, o carnaval...





quando estou sozinha, o vento passa diferente entre as folhas. o atendente da padaria dando bom dia a uma senhora nos comove, um sorriso cúmplice com a pessoa sentada ao lado é inevitável, por um instante parece que não estamos tão tristes.

num desses momentos, uma xícara de café com leite pode preencher quase uma hora, pra estender a sensação de amparo do morno do leite tocando a pele mais sensível da boca.

todas as vozes ficam opacas, a imersão não deixa ouvir, todos estão tão perto e tão distantes.

no momento que desci as escadas, já queria voltar, deitar com você de olhos fechados e só sentir o peso do seu braço na minha cintura, pra sentir algo que me prenda aqui.

pra sentir algo.

mas parece que ultimamente tudo que faço é agir e sentir em descompasso.

...

e no turbilhão do carnaval, dos encontros e desencontros, o tempo nos dá um descanso numa mesa de amigos, numa taça de vinho, numa noite de dança.

a vida brinca com a gente, canta no nosso ouvido, tira um sarro da nossa cara e nos acaricia o ventre, nos dá uma volta e nos leva embora, beija nossas costas, nos segura forte... e numa conversa arrastada e leve, num suspiro fundo, no salto, estamos soltos de novo.


3.2.15

sobre estar triste e continuar vivendo




sim, estou triste, qual é o grande problema com isso? é a vida...

tenho sentimentos, tem uns órgãos aqui dentro, que mesmo não entendendo bem porque e não sabendo o nome, se contorcem, se apertam, doem, quando menos espero. nó na garganta não é força de expressão.

e não era pra tanto, pode até ser, mas sabe já estou acostumada a sentir tudo grande, o amor, a alegria, a saudade, a raiva, a indignação e sim, a tristeza também.

teve um momento da minha vida que tive que escolher, não sentir nada ou continuar sentindo tanto. fugi do sentir nada com todas as minhas forças. não me dopar, anular, cegar, mascarar, foi uma das poucas grandes certezas que tive.

e agora, sigo assim, feliz... e triste também.

não significa que não entendo a importância de tudo o que estou envolvida. não significa que vou viver com menos empenho.

não significa que não posso rir com amigos e tomar umas cervejas.

não significa que não posso ficar feliz pelo momento feliz de outras pessoas, ainda mais se for uma pessoa querida e especial para mim.

não significa que a minha tristeza é mais importante que a tristeza e sofrimento dos outros, do mundo.

mas, com licença, é assim que me sinto por enquanto e sei que tenho meu tempo... mais ainda, sei que preciso viver o que sinto, só assim os sentimentos tem a chance de se transformar, posso crescer, não me perder e ser eu.

nessa neura de ser exatamente o que se é, nas minhas voltas malucas, sei que chego onde preciso chegar, onde quero.

aliás, há pouco tempo, numa conversa importante, uma pessoa que admiro muito, Brandão, me falava sobre como esses sentimentos nos tornam humanos e que justamente por sentirmos tanto, temos essa urgência e necessidade de mudar tanta coisa, de lutar, de arriscar, de dedicar uma vida.

é contraditório e é assim.




30.1.15

Ela




há um tempo assisti esse filme surreal que é tão bonito, no qual um cara se apaixona por um sistema operacional através de um celular. mesmo reconhecendo todos aqueles sentimentos e me entregando às vozes e cenas de cores alaranjadas, não acreditava que poderia viver algo assim.

me sentia distante de toda essa tecnologia e solidão, me cercava de barreiras pra resistir a rapidez e a falta de carne, pele e sangue nas veias dessas relações.

aí, a vida te prega uma dessas, de repente você se vê passando por todas essas sensações olhando pra telinha de um aparelho de celular... é por ele que tudo aos poucos começa com a troca de palavras embaraçadas ou exageradas, é por onde falamos das saudades e buscamos o alívio das angústias.

é por ele que sentimos o frio da distância conectada.

a coisa toma uma proporção, as relações reais ficam impossíveis por uma série de motivos complicados e emaranhados, e o coração aperta a ponto de transbordar nos olhos sem querer...

você está sozinha em casa e não tem a quem chamar, as distâncias são amplificadas pela vida que levamos, o ombro, a voz e o abraço urgentes são substituídos por palavras de uma amiga querida dos tempos de faculdade, vindas do outro lado da cidade. eu chorando na minha cama, ela com seus meninos que caíram no sono um de cada lado, e alguma disposição, mesmo com todo cansaço, as duas motivadas por muito carinho e saudade.

o amor, que um dia foi pele, saliva e carne promete ser cada vez mais distante, a quilômetros e quilômetros, no mesmo bairro, na mesma sala... e toda necessidade e desejo se vêem acalentados por algumas palavras nessa tela, que ilumina seu rosto no quarto escuro, e que ao menos por enquanto, é sua única ligação.


26.1.15

faz ideia amor




encontrar o amor
e perder

encontrar o amor
embrulha, aperta, afrouxa, sossega, desinquieta

perder o amor
num mal entendido
num silêncio
no medo
num fim de semana distraído
numa lata de cerveja

pra encontrar o amor
coragem, só

e perder?

já tentei toda forma de desapego, mas é certo que vou perder as estribeiras no medo de cada esquina

e todo amor vendido insiste
queria evitar o engano e fugir, de tudo

a vida aperta mais um pouco, a gente se distrai e volta a se concentrar no que importa...
deixa a vida pra depois
e mais um pouco

vida
morte, deixa, deita, beija

urgência:
o pedaço de carne contra o peito
e a planta do pé queimando no asfalto

porque numa noite temos tudo, temos o amor, somos reis
na manhã seguinte, todo mundo é peão